POLÍTICA

Segurança pública passa por prevenção, mas também por repressão

Foto Mara Steffens/O Correspondente

 

A Câmara de Vereadores recebeu na noite desta quinta-feira (6) a audiência pública para debater a segurança em Carazinho. Motivada pelo índice de violência registrado em março, o Legislativo convidou lideranças de vários segmentos, especialmente do político, da própria segurança e do judiciário para a conversa. Comum entre praticamente todos os que se manifestaram, a ideia de as drogas estão o centro da problemática e que trabalhar com prevenção, mas também com uma repressão eficaz pode ser o caminho. "Queremos entender a situação e corroborar com os entes públicos da segurança. Não é um problema específico de Carazinho, mas enquanto poder Legislativo sabemos da dedicação plena de vocês (os orgãos de segurança). Queremos colocar nossa parcela, ouvir e buscar alternativas. Sabendo da realidade podemos circular no meio político e buscar quem sabe recursos financeiros, humanos", disse a presidente do Legislativo, Janete Ross de Oliveira. 

 

 

O comandante do 38º Batalhão de Polícia Militar, Major Juliano Moura. Ele destacou a importância de o encontro ter resolutividade, e apresentou dados. "Nos últimos anos, apesar de todas as dificudlades que os orgãos público tem, os índices vêm caíndo, ano após ano. No delito de homicídio que é o mais grave, que os índices criminais pautam a segurança pública, saímos 2016 com 28 casos e em 2022, 16. Os roubos fechamos 2016 com 95 e no ano passado 38. Segurança pública deve ser debatida pela sociedade, investimento forte de todos os setores, mas é algo que deve ser feito a várias mãos", colocou. Ele reforçou que a Brigada MIlitar faz um planejamento estratégico para trabalhar buscando a diminuição dos índices, mas o assunto é bem mais complexo. "Hoje vivemos a questão da interiorização das facções, que estão saíndo da capital e se instando no interior do Estado. Temos aqui, especificamente na nossa região, um local que está sendo rota do tráfico. Uma das portas de entrada é o sul do Estado, mas aqui no norte, a segunda entrada de drogas que vem do Paraguai. É uma preocupação grande de combatermos as facções", mencionou. 

 

 

A delegada de Polícia Rita De Carli falou sobre o trabalho do órgão. "Nos últimos anos temos tido investimento significativo, especialmente com auxílio da comunidade. Tivemos a instalação da DRACO, que é uma delegacia especializada, que  além do crime organizado, da lavagem de dinheiro, ela também enfrenta os homicídios dolosos. Já tivemos alguns resutlados positivo este ano na investigação de crimes graves neste ano", salientou, confirmando que existe a presença  de uma facção criminosa na cidade que, segundo ela, domina o tráfico de drogas na cidade. Ela abordou também sublinhou as dificuldades enfrentadas no trabalho, especialmente por causa da falta de efetivo. 

 

 

O promotor de Justiça, Juliano Grizza, lembrou que quando chegou a Carazinho, há cerca de 9 anos, os apenados dos regimes aberto, semiaberto e fechado estavam reclusos. Hoje apenas o fechado está efetivamente dentro do sistema prisional. Os demais estão em prisão domiciliar e não há fiscalização se eles estão cumprindo com as determinações. "Não mudou a lei. Ela é a mesma, o que acontece é que o sistema que está fadado (ao fracasso). Olhamos para o Supremo e o legado é o direito e as garantias, só que o que parece que é os diretos e as garantias para quem cometeu os crimes e a sociedade é relegada a um segundo plano. Em Carazinho, como em toda região e talvez do Rio Grande do Sul, até quatro anos é regime aberto, prisão domiciliar. Não há fiscalização. De 5 a 7 anos, semiaberto, tornozeleira. A Polícia prende 10 pessoas, talvez quatro ou cinco estão com tornozeleira. Ou seja, estão cumprindo uma pena e comentendo crime. Não vejo a nível estadual ou nacional uma mudança neste sentido. Isso dificulta cada vez mais o trabalho policial que prende e vem lá de cima um entendimento que não podia prender, que não podia fazer assim, e pessoa que é pega com 10Kg de droga no outro dia está na rua", criticou. 

 

 

Outro ponto salientado por Grizza é o uso das drogas."É um recado pessoal meu à sociedade. Está tudo relacionado à droga. A Polícia tira um traficante da rua, e isso ocorre todo dia, não passa meia hora, já há um susbstituto para ele. Porque lá na ponta, tem quem compra. Quem usa? É o cara do bairro, mas a alta sociedade também! Então seja qual o nível que for, tem que entender que está patrocinando a facção vir para Carazinho. Há 8 anos eu denunciava uma pessoa por posse de droga porque era crime. Depois ela continuou sendo crime, mas ela não pode ser presa. Hoje nem se dá prosseguimento a uma ação penal por posse de droga. Se a soceidade está entedendo, talvez, como política de segurança, que o consumo é permitido, estamos incentivando as facções que vão extorquir empresários e mandar matar", criticou. 

 

 

O sistema prisional 

O juiz Márcio Cesar Sfredo Monteiro, diretor do Fórum de Carazinho, comentou sobre o sistema carcerário e a importância de se ter vagas suficientes para que quem foi condenado cumpra a pena imposta e criticou a posição de Carazinho que é contrária a construção de uma unidade prisional ventilada para o Estado, entre o município e Passo Fundo. "Temos um projeto de presídio para ser construído na divisa de Carazinho e Passo Fundo, em 2010, com doação do terreno pela cidade de Passo Fundo, que ocorreu em 2005. Estamos há 13 anos esperando a construção de um lugar para onde poderiam ser levados os presos inclusive de Carazinho. Apesar disso existe um movimento da sociedade organizada de Carazinho para que ele não seja construído", afirmou, relatando que foi convidado para uma reunião na prefeitura em que ele foi a unica pessoa favorável a construção no local designado. "As desculpas foram problema ambiental (tem laudo e autorização da Fepam), que vai se criar vilas de parentes de presos (nunca ouvi um argumento tão estapafúrdio) e agora foi investado um sítio arqueológico que nunca havia sido aventado antes na história e está no Iphan para que um laudo seja feito por um arqueólogo. Desde 2004 se tem a notícia de superlotação em Passo Fundo e não é diferente aqui. É legal exigir condenação de preso, mas se exige vaga para que a gente possa mandar este preso para o presídio?", argumentou, salientando que a falta de vaga explica, na visão do magistrado, o fato de que quem possui condenção estar em prisão domiciliar ao invés de encarcerado. "Se optou por prender e deixar no fechado aqueles considerados mais perigosos e dando tratamento menos rigoroso para aqueles que não tinha vaga para entrar no sistema", justificou. 

 

 

Respondendo alguns questionamentos, Monteiro disse que a construção do Presídio de Passo Fundo próximo a Carazinho é uma determinação judicial e que pode haver uma ação civil pública determinando que o Estado adquira tornozeleiras eletrônicas, mas o Judiciário precisa ser provocado para isso. Além disso, ele considera válida a instalação de câmeras nos coletes de policiais e em viaturas, a fim de contribuir para materializar os crimes e garantir provas, exemplo que já é seguido por outros Estados, entre eles São Paulo. "Muitas vezes a polícia sabe que o crime está ocorrendo, mas em função da lei de abuso de autoridade fica com receio de ser enquadrado nela. As câmeras poderiam ajudar a polícia que poderia agir no momento em que o crime ocorre e ainda se resguardar", comentou. A ideia também foi comentada pelo Major Moura, que citou que o comando já se manifestou favorável e que os policiais não se opõem e sabem que será benéfico até como forma de proteção à conduta honesta. 

 

 

Lógica invertida

Promotora da Infância da Juventude, Adriana Costa, comentou sobre a importância de prevenir a criminalidade entre crianças e adolescentes, mas que a repressão que ainda é necessária. Sobre a participação de menores em crimes graves, como os homicídios, ela apontou as escolhas que são feitas. "Para o criminoso, o crime é uma escolha. Não importa se ele veio de uma família vulnerável, ou se ele teve oportunidade na vida, porque temos inúmeras famílias que vivem em condições vulneráveis e que vencem pelo trabalho. É uma questão de ônus e bônus e que temos que dar mais ônus que bônus ao criminosos", opinou. "Não acredito em prevenção sem repressão. Precisamos mostrar para as futuras gerações que o crime não compensa. A maior dificuldade que eu sinto na promotoria pe convencer os jovens que eu atendo que vale a pena estudar. Vocês não tem noção da quantidade de horas que perdemos, toda a rede de proteção, na tal da busca ativa escolar. Cada vez que vamos atrás perdemos horas tentando convencer eles de que vale a pena seguir o caminho do bem. E foram várias as vezes em que eu ouvi 'mas o fulano que é meu vizinho tem uma vida melhor. Ele trabalha pro trafico. Minha família cata lixo. Ele enxerga no projeto do crime, um projeto que dá mais bônus e ônus. Não pode ser assim. Não vamos conseguir trabalhar com  prevenção, com educação, enquanto for muito lucratico trabaahr com o crime", acrescentou. 

 

 

Ela citando o episódio de Blumenau, em que crianças foram assassinadas brutalmente por um homem que está preso, como outro exemplo. "Um ato bárbaro como aquele, vocês sabem qual será a primeira vez em que ele terá contato com o juiz do processo criminal dele? Será numa audiência de custódia para perguntar se ele foi bem tratado ao ser preso, depois de ter matato a machadada quatro crianças. A nossa lógica está invertida. Estamos pensando muito no criminoso e pouco na vítima. E estamos vitimando toda uma geração porque não reprimimos o crime e toda uma geração está sendo mandada para o crime porque damos proteção, porque eu não consigo oferecer algo para essas crianças tão rentável quanto é o crime", observou. 

 

 

Ainda conforme Adriana, os processos que correm atualmente envolvendo menores são antigos e já faz um bom tempo em que há uma redução drástica nos casos. Apenas um ocorreu recentemente e envolveu um menor com representação pela internação dele. O juizado negou, houve recuso e o Tribunal de Justiça mantece a decisão local, então o adolescente não foi internado no CASE porque o processe está no início. 

 

 

Sobre adolescentes que cumprem medida socioeducativa, há 19 adolescentes em Carazinho, em meio aberto. Não há nenhum no CASE, realidade bem diferente de 2015, quando Adriano chegou a Carazinho. Eram 18. A pandemia pode ter contribuindo para isso, mas a promota salienta que os dados podem não ser tão fieis. Processos ficaram parados em razão da Covid-19 e por isso pode ser que não hajam carazinhenses no CASE. 

 

Data: 07/04/2023 - 09:02

Fonte: Mara Steffens

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