ESPORTES

A relação dos carazinhenses com Pelé

Jorge e os filhos (Foto Mara Steffens/O Correspondente)

 

O mundo todo lamenta a morte do Rei Pelé. Internado há mais de 30 dias no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, Edson Arantes do Nascimento teve falência múltipla de órgãos, consequência de um câncer de cólon diagnosticado há vários meses.

Gente de toda parte, famosos ou não, vem declarando sua admiração pelo ex-jogador que simplesmente mudou o futebol e o esporte como um todo com sua genialidade. Quem não gostaria de ter tido a oportunidade de ver pessoalmente os lances incríveis que ele protagonizou?

Em Carazinho, numa pacata rua do bairro Oriental mora um homem que sente de forma especial a partida do atleta do século XX. Jorge Nelson da Silva, conhecido na comunidade esportiva como Mala, guarda uma lembrança fantástica. O carazinhense foi jogador profissional de futebol e teve a honra de enfrentar Pelé em duas oportunidades. O Santos veio ao Rio Grande do Sul quando o Rei tinha 17 anos para vários amistosos. Um dos duelos foi diante do Grêmio na época defendido por seu Jorge, então com 20 anos. Zagueiro de origem, jogou aquela partida de lateral direito. “Naquele tempo fazíamos marcação por zona. Você devia cuidar da tua parte do campo.  Enfrentei o Pelé duas vezes, mas quase não o vi”, brinca ele, referindo-se à velocidade do Rei, que facilmente engava os adversários, deixando-os para traz.

Com quase 1,90m e bom cabeceador, habilidade que lhe rendeu o título de vice-goleador goleador gaúcho na década de 1960 com 17 gols, seu Jorge recorda de um lance de escanteio que favoreceu o Santos. “O Pelé não era um jogador tão alto. Nunca me esqueci de um lance em que subi para tirar a bola e ele subiu comigo. Mesmo bem mais baixo que eu, ele saltou bem mais alto”, conta.

A notícia da morte do ex-jogador deixou o ex-zagueiro triste. “Fiquei muito mal. Tudo que é bom parece que se vai. Nunca mais houve outro como ele. E nem vai existir”, colocou. “Ele tinha uma explosão incrível. Diferente de Guarincha, que era habilidoso. Foi uma época muito boa”, recorda ele, que jogou também no Criciúma e encerrou a carreira no Glória, antes da fusão com o Veterano que fez nascer o Atlético.

Desde criança os filhos de seus Jorge ouvem as histórias esportivas do pai, e os episódios de enfrentamento do Rei não ficaram de fora. “Ver ao vivo já foi para poucos, imagina estar no mesmo campo”, aponta George, o caçula. “Desde pequenos escutamos estas histórias e é muito legal saber que o pai teve esta oportunidade”, acrescenta a irmã Débora.

A seleção brasileira da época do Rei é definida pelo ex-jogador carazinhense como uma máquina, diferente dos elencos mais recentes. “Falta aplicação. Tem mais nome que futebol. O dinheiro parece ser mais importante. Na época de Pelé os jogadores vestiam a camisa de verdade, lutavam pelo país”, opina.

Seu Jorge parou de jogar profissionalmente com 32 anos. “Hoje a preparação do jogador é outra, é mais refinada, mais trabalhada, e o atleta joga por mais tempo. Na minha época a gente só dependia da nossa vontade, jogava mais por amor pela camiseta”, declara.

A amor de seu Jorge por futebol passou para os filhos. Débora participava de torneios amadores femininos quando mais jovem e George, que todos conhecem por Malinha, foi atleta profissional de futsal. Passou por Sercesa e Pinheiro (do qual hoje é presidente), além de atuar em Salto do Jacuí e em Santa Catarina.

 

Mais lembranças do Rei

Eduardo Gomes jogava no Corinthians quando viu Pelé de perto. O eterno camisa 10 já estava quando cerca de 50 anos e defendia a seleção brasileira máster. “Vi ele jogar na inauguração do CT do Santos Futebol Clube, quando ele marcou o primeiro gol do CT. Estava em forma mesmo aos 50 anos. Ainda desafiava os jogadores da seleção Brasileira da época”, destaca.

Além daquela oportunidade ímpar de ver o Rei em campo, Gomes ouviu muitas histórias. “O professor Ado, ex-goleiro do Corinthians e da seleção, foi um dos meus conselheiros. Através dele fui jogar no Londrina. Éramos muito amigos e ele sempre me contava as histórias do Rei. Ado foi campeão da Copa de 1970 com Pelé”, salienta. “Vai embora um cidadão que transformou o futebol de um simples esporte para uma arte, uma magia. Vai embora o rei da plástica, da habilidade, da genialidade e um cidadão que virou um adjetivo de tudo que existe de arte. Atingiu a perfeição no futebol. Ninguém chegou tão perto dele. Não surgirá nada parecido. Será o eterno Rei do Futebol, simples assim”, lamenta.

Gilberto Kamphorst, o Gibão, acompanhava Pelé pela mídia disponível da época. “Tive a grata satisfação no início dos anos 1970, pós-copa do México, de acompanhar o final da carreira dele. Especialmente, 71, 72, 73, ouvindo os jogos pelo rádio, especialmente conta Grêmio e Inter, mas também em nível nacional, especialmente pelas rádios Tupi, Globo e Record, que tinham inserção fantástica aqui no sul, além da Revista Placar, que era o grande veículo esportivo da época. Tinham edições semanais”, enumera.

Entre os jogos memoráveis que viu, Gibão destaca a final do paulistão em que foram decretados dois campeões, Santos de Pelé e Portuguesa, além do confronto contra o Vasco, no Rio, quando ele anotou o milésimo gol. “Eu era bem jovem, mas desde cedo sempre fui legado na área esportiva e procurava acompanhar. Televisão era rara. Nós nem tínhamos em casa. Então era mais rádio. Lembro que ouvi a transmissão da inauguração do Colosso da Lagoa, em Erechim, que teve a presença dele. Ele foi autor de um dos gols. Depois tivemos o goleiro Irno, que era de Carazinho, do Veterano, e chegou ao Santos, onde foi companheiro de Pelé, embora tenha sido reserva do Gilmar, mas esteve em inúmeras excursões porque o Santos era requisitado para jogar no mundo todo”, recorda.

O velório de Pelé começa às 10h de segunda-feira (2), na Vila Belmiro, onde jogou quase toda carreira. O sepultamento será no dia seguinte, no Memorial Necrópole Ecumênica.

Data: 30/12/2022 - 18:00

Fonte: Mara Steffens

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